(para George Floyd)
Com o sangue
encharcado de revolta,
tingi os muros da cidade,
atingida por implacáveis vírus,
governantes mórbidos
e marchas neofascistas.
Há um vazio nas ruas,
vazio do medo
que isola abraços
e libera humanimaldades
Na tela da TV,
o abismo fita meus olhos fundos.
Sentada na calçada do chão,
uma jovem tariana
esmaga sua cabeça
na indiferença do Delphina Aziz,
o frio hospital de referência
da abandonada Manaus.
Nesses dias plúmbeos,
enquanto um cínico capitão passa a cavalo,
pás mecânicas nos soterram com os corpos mortos.
Debochado, ri o capitão,
brincando nos lagos do planalto central,
enquanto caminhões frigoríficos nos congelam nas filas de espera.
Nesses dias plúmbeos,
(im)potentes enfermeiras (re)humanizam nossos corpos anônimos
George Floyd,
tua esmagada voz
esmaga fronteiras e (in)consciências.
Eu não consigo respirar
Eu não consigo respirar
Eu não consigo respirar
(Gerson Albuquerque, desde certa Amazônia, junho de 2020)