Impressiona em Amálio Pinheiro o saber lidar com o verso, a medida, ritmo e sonoridade. Dá-se a condução perfeita do insuspeitado metro, que regula o discurso, mesmo para depois soltar-se. É aí que se complementam em exercício poético “a textura de uma folha e a trama de uma palha”.
O aparecimento deste livro nos redime, fazendo crer que se trata de uma conquista do poeta, que nos vem libertar das repetições cansativas ou da pressa de dizer… – Jerusa Pires Ferreira
XXII
Não sei aonde se prepara para mim
a mulher que não terei,
com seus signos de outrora;
não sei por que ruas anda perdida
a minha imagen,
com uma estranha companheira
em um trem de última hora;
não sei em que estações e entroncamentos
minha bagagem me espera paciente
com meus utensílios caseiros;
não sei aonde não fui
e deveria ter ido;
não sei que outra parte de mim
continua viajando, sozinha,
antes de eu vir, depois de eu haver ido.
(De Regressos)