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o pauloleminsky
é um cachorro louco
que debe ser morto
a pau a pedra
a fogo a pique
senão ê bem capaz
o filhadaputa
de fazer chover
em nosso piquenique
*
Será preciso
explicar o sorriso
da Mona Lisa
para que você
acredite em mim
quando digo
que o tempo passa?
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aqui
nesta pedra
alguém sentou
olhando o mar
o mar
não parou
pra ser olhado
foi mar
pra tudo quanto é lado
*
distraídos venceremos
Paulo Leminski foi corajoso o bastante para se equilibrar entre duas enormes construções que rivalizavam na década de 1970, quando publicava seus primeiros versos: a poesia concreta, de feição mais erudita e super informada, e a lírica que florescia entre os jovens de vinte e poucos anos da chamada ¿geração mimeógrafo¿.
Ao conciliar a rigidez da construção formal e o mais genuíno coloquialismo, o autor praticou ao longo de sua vida um jogo de gato e rato com leitores e críticos. Se por um lado tinha pleno conhecimento do que se produzira de melhor na poesia ¿ do Ocidente e do Oriente ¿, por outro parecia comprazer -se em mostrar um ¿à vontade¿ que não raro beirava o improviso, dando um nó na cabeça dos mais conservadores. Pura artimanha de um poeta consciente e dotado das melhores ferramentas para escrever versos.
Entre sua estreia na poesia, em 1976, e sua morte, em 1989, a poucos meses de completar 45 anos, Leminski iria ocupar uma zona fronteiriça única na poesia contemporânea brasileira, pela qual transitariam, de forma legítima ou como contrabando, o erudito e o pop, o ultraconcentrado e a matéria mais prosaica. Não à toa, um dos títulos mais felizes de sua bibliografia é Caprichos & relaxos: uma fórmula e um programa poético encapsulados com maestria.
Este volume percorre, pela primeira vez, a trajetória poética completa do autor curitibano, mestre do verso lapidar e da astúcia. Livros hoje clássicos como Distraídos venceremos e La vie en close, além de raridades como Quarenta clics em Curitiba e versos já fora de catálogo estão agora novamente à disposição dos leitores, com inédito apuro editorial. (Los editores)